sábado, 20 de agosto de 2011

Sensível para o clássico e o popular, Geraldo Santa Rita

Duas composições bastante excêntricas marcam o compositor Geraldo Santa Rita, na história da Unidos de Lucas. Uma, em parceria com Gustavo e Antônio Gaucho, é "Olha que coisa mais linda mais cheia de graça", homenagem a Vinícius de Moraes, em 1987, marcando o último estágio de um estilo hiperclássico na letra e na melodia.  A homenagem é mais tributo em tom de reverência que biografia, tributo este como os dos saudosos sambas da década de 60. Neste ponto chega a ser bastante claro como aqueles:

Através de suas obras geniais
Seu nome foi consagrado
Na galeria dos imortais 

Outro ponto clássico do samba é dizer em si o que vai fazer com o enredo como o "Aquarela" de Silas, que dizia: “... É um episódio relicário / Que o artista num sonho genial / Escolheu para este carnaval”:

É Carnaval, é alegria
Lucas faz com euforia
Um tributo a Vinícius de Moraes 

Outro ponto é citar fatos do trabalho do homenageado em síntese, bastante nominal, sem firulas, sem jogo de palavras complexas. É bastante laudatório, descritivo e, principalmente, sem gírias:

Oh! Menestrel...
Diplomata, jornalista, escritor
Compositor de rara inspiração                                                                                                           Peças teatrais, temas colossais
Como "Orfeu da Conceição"

 É claro que lembra um "Sertões" no aspecto descritivo simples: " A terra é seca /Mal se pode cultivar / Morrem as plantas / E foge o ar." Ou ainda, outro bem enfático neste estilo, é o samba "O mundo de mestre Vitalino" da Império da Tijuca em 1977, reeditado em 2009 : “...Grupo de bravos soldados /Camponês e lenhador (ôô ôô) /Boiadeiros e rendeiras /Lampião e seu amor / O caçador com seu cão a farejar”.

Há muito que se estudar sobre os clássicos do samba quanto ao estilo da letra, mas se for lembrar também de melodia em nada deixa dever aos grandes sambas. Você pode ouvi-lo e confirmar seu ritmo bem parecido aos classicos mais antigos: 

Através de suas obras geniais
Seu nome foi consagrado
Na galeria dos imortais
É Carnaval, é alegria
Lucas faz com euforia
Um tributo a Vinícius de Moraes
Oh! Menestrel...
Diplomata, jornalista, escritor
Compositor de rara inspiração
Peças teatrais, temas colossais
Como "Orfeu da Conceição"
Olha que coisa mais linda
Mais cheia de graça
Quanta imaginação
A beleza, a poesia
Cantada em forma de canção
Sensível para o clássico e o popular
O piano, o bar, a esquina
E o papo com as meninas à beira-mar
E com Toquinho, Carlos Lyra, Baden Powell e Tom Jobim
O poetinha fez da vida
Uma canção sem fim
(Oh! Mestre...)
Como recordar é viver
E por falar em saudade
Onde andará você
E entretanto é preciso cantar
Para alegrar a cidade
Neste festa popular


Outro samba de Geraldo é "Baía com I" de 1992, desta vez em parceria com Adelson, Barcelos e Paulo Roberto, apenas pouco tempo depois do outro, samba completamente diferente do anterior. Primeiro, ele possui a beleza de contar uma historia do Brasil, a invasão francesa na Baía de Guanabara do jeito popular carioca. Quebra tabus e prova como a linguagem regional do samba pode contar uma história em verso e música. O detalhe da invasor é narrado com a pura malandragem da gíria:

E assim
Um-sete-um poluidor, desembarcou
De gravata e paletó, vejam só
Rola o que sempre rolou

O samba não se limita a “pegar” formas e jeitos do popular; ele inventa gíria. Que barato é esse “um-sete-um poluidor” para o estrangeiro muambeiro que devasta a natureza, onde faz comércio com o pau-brasil, bem oportuno pela onda da eco 92! “De gravata e palitó” humoriza os empresários pelas gírias do “vejam só” e “rola o que sempre rolou”. Outra expressão marcante é o “Na Rio-Street, o armador”, dentre outras que pode merecer observação mais detalhada.

Outro traço inovador é que a história contada por gírias não perde o tom dramático e poético:

O índio viu, quando partiu
Na caravela o pau-brasil
Transação, pirataria
No espelho d'água da baía

Vale muito a pena ouvir o samba e se convidar a uma pesquisa: se o compositor também faz poesia, pode-se descrever um compositor em relação à tendência de sua época. E o carnaval do Acesso e os sambas podem ser ouvidos de uma outra maneira que não seja a daquela crítica vulgar do “é bom ou é ruim” ou do “gostei ou não gostei”?

Baía com "i", baía
A mais bela do Brasil
Paraíso tropical, colossal
Onde tudo começou
O índio viu, quando partiu
Na caravela o pau-brasil
Transação, pirataria
No espelho d'água da baía
E assim
Um-sete-um poluidor, desembarcou
De gravata e paletó, vejam só
Rola o que sempre rolou
Veio de longe
Habitar os espigões
Mercador das ilusões
Na Rio-Street o "armador"
Caramba lá vem muamba
Ninguém sabe quem mandou (bis)
Ainda é
A menina dos olhos, "baía mulher"
Um brilhante visual (legal)
Que virou cartão postal
A Guanabara é do patropi
Hoje eu sou pirata na Sapucaí (bis)



http://www.4shared.com/audio/m6VfEjOv/1992_Unidos_de_Lucas.html


Um comentário:

  1. Há outro samba de Geraldo Santa Rita pela Unidos de Lucas em 1984: http://www.4shared.com/audio/jWlT_zvC/Unidos_de_Lucas_1984_-_Dana_Br.html

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