domingo, 4 de setembro de 2011

O segredo da estética do carnaval



Cabeças sem corpo
Esta foto é o quarto carro alegórico da escola de samba Império da Tijuca, que desfilou na manhã de domingo de carnaval pelo grupo de acesso a, um segundo grupo das escolas principais. O enredo foi “Um mistério chamado Brasil” e pretendeu associar o carnaval à história do Brasil. A alegoria é simples; não há extravagância de cores e objetos de luxo, e é oportuna para apresentar a contemporaneidade pobre do carnaval, feito pelo povo de baixos recursos financeiros.
Cabeças sem corpo é a estrutura profunda do carnaval. A cabeça do cisne se basta como o próprio ser inanimado, que ainda seria uma representação do animado. Harmonizam-se as duas cabeças em formação dual, à direita e à esquerda. Em ordem, há uma sincronia entre as partes com todos os demais elementos do carro. Em essência, visualiza-se o pano verde nu central, sem forma, sem folhas, sem fruto, em torre em forma de cone atrás, como a natureza verde morta pelas queimadas da Amazônia. O canto do cisne é a sua morte, resta-lhe o som, mas onde estaria a voz senão nas próprias  esculturas, o canto não pode ser nada que sua própria cabeça. E o canto dos sambistas, de calça branca e peito nu negro, deveriam ecoar: “E a queimada continua / A Amazônia já está ficando nua. (bis)” É nesse “recorte“ total da cabeça do cisne à direita de quem vê da arquibancada ou à esquerda de quem vê dos camarotes, junto ao cone verde nu, sem formas, sem riquezas de detalhes, nua como ficaria a Amazônia, é a representação essencial do carnaval que a literatura abarcou com o rufar de tambores, o zabumbar de bumbos e o gritar de homens. Ou esse paralelismo rítmico em consonância com a montagem de coisas e pessoas.

Fragmento retirado da monografia de curso de mestrado na UFRJ intitulada "Interseções de frações na fantasia da literatura e do carnaval de um eu na multidão".

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